sexta-feira, 14 de abril de 2017

KANT: SUJEITO E PREDICADO LÓGICO E REAL



É uma das dificuldades da Crítica da razão pura, e das outras duas críticas kantianas, a compreensão da terminologia usada. Na primeira crítica kantiana nos deparamos com termos como: “juízos analíticos” e “juízos sintéticos; “juízos”, “conceitos”, e “intuições” “a priori e “a posteriori”; “unidade analítica” e “unidade sintética”, dentre outros termos de difícil compreensão. Encontramos ainda entre os termos introduzidos por Kant, agora no capítulo sobre o “Paralogismo da razão pura”, a distinção entre conceito em sentido lógico e em sentido real. Tanto na posição de sujeito como na de predicado podem ser conceitos lógicos ou conceitos reais. Em sua refutação da prova ontológica da existência de Deus, Kant argumenta que existência não é um predicado real, é apenas um predicado lógico. O que isso significa? 

Para Kant, tudo o que pode ser representado como o conceito predicado de um juízo, ou tudo o que pode ser predicado de alguma coisa, é o seu predicado lógico. Ao passo que um predicado real indica uma propriedade que uma coisa ou que um sujeito tem ou não a tem. Assim, como nem tudo o que se pode predicar de algo ou de um sujeito qualquer em um juízo é uma propriedade dessa coisa, nem todo predicado lógico é também um predicado real. Voltemos ao conceito de existência. Esse conceito pode ser usado como um conceito sujeito ou como um conceito predicado em um juízo. Desse modo, o conceito de existência pode ser um predicado lógico porque pode ser predicado de alguma coisa, como no juízo "Deus existe". Só que o predicado de existência é apenas um predicado lógico, e não um predicado real, porque existência não é a propriedade de alguma coisa. No juízo "Deus existe" afirmamos que há uma relação entre um conceito e um objeto. A saber, afirmamos que há um objeto ao qual o conceito Deus corresponde, não afirmamos que há um objeto (Deus) que tem a propriedade de existência. Por conta de existência não ser uma propriedade de alguma coisa, o conceito de “existência” não pode fazer parte do conceito de alguma coisa, segue que juízos existenciais como “Deus existe” ou “Deus não existe” nunca podem implicar uma contradição conceitual.  


Assim como os predicados, Kant também distingue os conceitos sujeitos em lógico e real. O sujeito real é chamado de sujeito de inerência de um juízo e o sujeito lógico de sujeito absoluto de um juízo. O sujeito lógico de um juízo é tudo o que pode ser predicado de alguma coisa, tudo de um conceito que se pode usar como conceito-sujeito em um juízo podemos chamar de sujeito lógico. Ao passo que o sujeito real é aquele em que encontramos as propriedades inerentes ou substanciais de algo. Assim, nem tudo que podemos predicar alguma coisa em um juízo é algo em que as propriedades são inerentes. Por exemplo, em um juízo como “a cor azul é bonita” o sujeito “cor azul” é uma propriedade não substancial. 

Kant, no final da Analítica Transcendental da primeira crítica, ainda distingue, os objetos que são alguma coisa em sentido metafísico ou estrito e os que são algo em sentido lógico (A 290/B 346-7). Objetos lógicos também são chamados de "objetos do mero pensamento" (A 292/B 348) ou objetos de conceitos dos quais nenhuma intuição pode ser dada (A 290/B347). Exemplo de um "objeto do mero pensamento" é o conceito de espírito, ou substância pensante não corporal. Tal conceito não é contraditório, o que implica que podemos fazer juízos sobre espíritos sem nenhuma contradição. No entanto, como não podemos apontar na experiência para seres pensantes não corporais, não sabemos se esse conceito é vazio ou corresponde a algum objeto. Ele pode ser pensado sem contradição, mesmo que nenhum objeto corresponda a esse conceito na experiência. 


REFERÊNCIAS:

KANT, Immanuel. Crítica da razão pura. 6ª ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2008.
GLOCK, Hans-Johann (ed.). Strawson and Kant. Nova Iorque: Oxford University Press, 2003.

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