Ao
pensarmos, darmos argumentos, justificarmos determinados posicionamentos,
frequentemente estamos fazendo uso de princípios lógicos. Mesmo que não nos
apercebamos disso. Afinal, o que é a lógica? A fim de lançarmos alguma luz
sobre a questão, a seguir, veremos de forma breve um pouco de sua história. Em
outro momento, outra postagem, examinaremos algumas definições encontradas em alguns
manuais.
A
lógica foi fundada por Aristóteles, século IV a. C. E tal como foi concebida por
ele, teve o seu cerne na teoria do silogismo. Ou, na dedução, a partir de dois
enunciados declarativos, chamados premissas, de um outro, chamado conclusão. Observe
o seguinte silogismo: (A) “Todos os homens são mortais”, (B) “Sócrates é homem”;
Logo, (C) “Sócrates é mortal”. Os enunciados (A) e (B) são chamados de premissas
e (C) a conclusão. Os três enunciados juntos constituem uma inferência.
Os
escritos sobre lógica de Aristóteles foram reunidos no “Organon” que é um
conjunto composto de seis obras, a saber: (1) Categorias, (2) Da
interpretação [De Interpretatione (Peri Hermineias)], (3) Analíticos Anteriores [Analytica Priora], (4) Analíticos Posteriores [Analytica Posteriora], (5) Tópicos [Topica] e (6) Refutações
Sofísticas [De Sophisticis Elenchiis].
No tratado das (1) Categorias,
Aristóteles expõe o que chamamos sua teoria dos conceitos ou os componentes das
frases enunciativas. No tratado (2) Da
interpretação expõe o que chamamos a sua teoria do juízo em que trata das
frases enunciativas. Nos (3) Analíticos
Anteriores expõe sua teoria da inferência. Nos (4) Analíticos Posteriores trata da prova científica. Nos (5) Tópicos trata da dialética ou das
inferências de probabilidade. E nas (6) Refutações
sofísticas trata dos sofismas (erros de argumentação que aparentam veracidade). Além dessas obras, Aristóteles discute ainda questões sobre os princípios da lógica, por exemplo, no livro Γ do seu tratado da Metafísica.
A
lógica aristotélica, no essencial, se manteve praticamente inalterada até o
século XIX quando a lógica simbólica matemática foi fundada pelo matemático e
filósofo alemão Gottlob Frege. A nova lógica simbólica aparece primeiramente na
Conceitografia (Begriffschrift de 1879) de Frege. Apesar da lógica aristotélica se
manter praticamente inquestionada no essencial de Aristóteles (século IV a. C.) a
Frege (século XIX), a história da lógica pode ser classificada em três períodos.
[1] O primeiro é o da lógica
antiga que se estende de sua fundação por Aristóteles até o fim da idade média.
O segundo, é a lógica moderna ou lógica de Port-Royal
que tem início com a publicação de “La
Logique ou l’art de penser” (1662) de Arnauld e Nicole. E o terceiro
período é o da lógica atual que tem início com a Conceitografia (1879) de Frege.
O
segundo período da lógica é o mais improdutivo do ponto de vista lógico, apesar
de sua influência nos grandes sistemas filosóficos modernos, como em Kant e
Hegel. Na Crítica da razão pura, Kant
chega a afirmar que a lógica já nasceu pronta, desde Aristóteles, não cabendo
nenhum acréscimo essencial a ela. Na lógica de Port-Royal, a lógica é definida como “a arte de bem guiar a razão (raison).”. [2] Kant, que pertence a esse
período, e é tributário da lógica de Port-Royal,
define a lógica como a “ciência das leis necessárias do entendimento e da razão
em geral ou, o que é o mesmo, da mera forma do pensamento em geral” [3] Não obstante, Kant
enfatiza que isso não deve ser entendido de forma psicológica e nem subjetiva. A
lógica no período de Port-Royal é
definida como a teoria do pensamento correto. Enquanto a lógica aristotélica,
assim como para os lógicos atuais, a lógica é entendida como a teoria
da inferência válida.
Os
manuais de lógica até o desenvolvimento da lógica simbólica, costumavam ser
divididos em uma (1) teoria dos conceitos,
uma (2) teoria do juízo, e uma (3) teoria da inferência. Os lógicos de Port-Royal incluem ainda uma (4) doutrina do método. Inspiradas nessa
divisão da lógica, as três críticas de
Kant são organizadas em termos dos primeiros tratados de lógica de Aristóteles
em uma “doutrina dos elementos”, que contém uma “analítica” e uma “dialética”. Além
de uma “doutrina do método”, tal como na divisão da lógica de Port-Royal. A inserção na lógica feita pelos lógicos de Port-Royal é inspirada no Discours de la Méthode, de Descartes “la
méthode pour bien conduire sa raison e chercher la vérité dans les sciences” ou
“o método para bem guiar sua razão e buscar a verdade nas ciências”.
No
século XVII, com o desenvolvimento das ciências naturais, exigiu-se que, no
lugar da lógica escolástica, considerada estéril, por extrair consequências do
que já se sabe, fossem inseridos métodos para encontrar a verdade. Desse modo,
a lógica foi entendida como uma lógica da busca
pela verdade tendo um sentido mais lato que a tradicional lógica
aristotélica e a lógica atual, que são uma lógica
da inferência ou de fundamentação da
verdade. Assim, com a introdução da “doutrina do método”, foi acrescentado
um apêndice na lógica ao qual ela nunca pretendeu de encontrar a verdade, enquanto a lógica como
teoria da inferência, tal como entendida por Aristóteles e na lógica atual, é
uma lógica da inferência e visa fundamentar
a verdade.
REFERÊNCIAS:
TUGENDHAT, Ernst e Wolf,
Ursula. Propedêutica lógico-semântica.
Rio de Janeiro: Vozes, 2005.